Acredita-se, portanto, que a BSE tem origem na alteração conformacional da PrPc em PrPres. Estas duas proteínas têm o mesmo número de aminoácidos (231 a 253, aproximadamente) (2), sendo, portanto, do mesmo tipo, e diferem apenas na sua estrutura tridimensional: a PrPc apresenta folhas alfa-helicoidais que são convertidas em folhas beta, o que torna a PrPres insolúvel e, portanto, mais resistente (3, 19).
Como já foi referido, a PrPc encontra-se maioritariamente nas células nervosas dos hospedeiros que possuem, por sua vez, um gene que a codifica, o PRNP (3). Esta proteína
possui diferentes domínios, incluindo um sinal peptídico no extremo
amino-terminal (cerca de 100 aa), uma série de cinco repetições de octapéptidos
ricos em prolina e glicina, um segmento central
hidrofóbico altamente conservado e uma região hidrofóbica no extremo
carboxilo-terminal (~ 100 aa). Esta região é estabilizada por uma única ponte
dissulfureto, é constituída por três
-hélices
e duas folhas
e funciona como um sinal para a adição de uma âncora de fosfatidilinositol à membrana, o que permite
que a PrPc se mantenha à superfície das células. Como acontece com
qualquer proteína, a PrPc é sintetizada no RER e transportada para o
Complexo de Golgi. Durante a sua biossíntese, sofre diversas modificações
pós-transduccionais, ainda não totalmente esclarecidas, tendo-se verificado que
a proteína tem tendência a modificar-se para a sua forma patogénica. (1, 2, 19).
Ilustração 5 - PrPc
Quando se dá a sua conversão em PrPres, esta nova forma patogénica tende a formar agregados parcialmente resistentes (11) a proteases (nomeadamente a protease K), sejam elas endógenas ou exógenas (1, 2).
Como muitos priões entram no organismo através da ingestão directa (20), verifica-se que muitos destes conseguem viajar desde o tracto digestivo até ao sistema nervoso central (2, 19). Ao chegarem ao intestino, estas proteínas infecciosas penetram na mucosa e alcançam as placas de Peyer (2), onde se depositam e replicam ao nível das células dendítricas foliculares [1]. Embora não haja certezas quanto à forma como os priões alcançam efectivamente as CDF, foram propostos como transportadores vários tipos de células, nomeadamente os enterócitos, os fagócitos mononucleares e as células M, sendo as últimas as mais aceites actualmente.
As células M são células especializadas no transporte transepitelial de macromoléculas e de alguns antigénios. Embora permitam ao organismo do hospedeiro uma adequada resposta imunitária ao nível do lúmen intestinal, as células M são muitas vezes “exploradas” por microorganismos patogénicos que as usam para entrar na mucosa, como se acredita ser o caso dos priões (20).
Ilustração 7 - Transporte transepitelial de priões
Além das CDF, acredita-se que os priões também se depositam e replicam no sistema linforreticular (vasos e nódulos linfáticos), de onde avançam através do sistema nervoso periférico até alcançar o cérebro do hospedeiro, onde acabam por se acumular (2, 19).
Os priões possuem outras características, nomeadamente a sua resistência ao meio externo e a acções físico-químicas, sendo capazes de suportar condições extremas: embora muitos (senão todos) fiquem inactivados, em condições normais, a temperaturas entre os 134 e os 138 , outros toleram, em condições de calor seco, temperaturas até aos 360 . Além disso, suportam grandes variações de pH, desde valores muito ácidos a muito alcalinos, podendo permanecer nos solos por um período de 3 anos (1, 19, 20). Apesar da sua elevada resistência, os priões são sensíveis ao hipoclorito de sódio [1] (1).
Tabela 3 - Diferenças entre PrPc e PrPres (2).
Existe uma barreira de espécies que, teoricamente, restringe a transmissão de doenças priónicas entre diferentes espécies de mamíferos. Tal acontece porque os genes PrP dos mamíferos são altamente conservados, o que leva a que apenas um número limitado de conformações da proteína PrPres seja termodinamicamente favorável. Visto que priões de duas espécies diferentes terão muito provavelmente poucas semelhanças conformacionais, a barreira de transmissão será muito elevada e impedirá, normalmente, uma infecção por priões. Se houver, no entanto, uma grande semelhança conformacional entre as PrPres de duas espécies diferentes, a transmissão de encefalopatias espongiformes transmissíveis é mais simples e viável (2).
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